Capítulo 2 - A conquista do topo de África
(12/ago – 27/ago/2004) BSB à GRU à Johannesburg (África do Sul) à Nairobi (Kenya) à Arusha (Tanzania)
Se você é um amante da Natureza e se encanta vendo os programas na TV
com aqueles animais selvagens caçando, copulando, vivendo plenamente nas
maravilhosas savanas da África, então dê um jeito de ir...é simplesmente
FANTÁSTICO!
Essa é uma das melhores viagens que já fiz na minha vida. Tenho vontade
de parar um tempo e cruzar o continente, passando por vários parques e
encarando de verdade a ‘vida selvagem’.
Diferente da primeira impressão que, em regra, temos quando vamos para
um lugar ''muito diferente'', eu simplesmente me encantei com tudo: povo lindo,
pele, sorriso, simpatia! Você esquece a pobreza, a sujeira, o perigo.
Entramos de verdade na ‘viagem’ quando pegamos um ônibus pela estrada
poeirenta (~270Km) que nos leva para Arusha, na Tanzania. Ao lado da estrada várias
acácias (aquelas árvores que dão a frutinha que a girafa come) e cactos
gigantes, que são árvores de verdade.
O objetivo principal era subir o ‘Kili’ e depois, é claro, conhecer a
vida selvagem.
O Kilimanjaro é um vulcão extinto, não fica numa cordilheira, é uma
montanha isolada, a mais alta do continente africano, e fica no meio do nada. A
vista do cume dá um panorama maravilhoso de toda a savana, todo o continente
africano aos seus pés.
O Frederick, nosso guia, eu, e o Kili no fundo.
Na subida passamos por savana, floresta, campos de altitude e assim
vamos ganhando o céu. A lava é fértil, a montanha tem várias espécies de
plantas endêmicas, e tem várias florzinhas coloridas enfeitando por toda a
parte. Entramos pela rota Machame (1.840m), e para irmos ganhando altitude mais
devagar, fomos circundando a montanha.
Bom, vou contar um pouco do dia-a-dia...
No primeiro dia de trilha (14/08) entramos por uma floresta tropical,
100% de umidade, cenário bem conhecido por nós, macacos nas árvores, muitos
pássaros. Subindo já percebemos a mudança na vegetação, passamos para os campos
de altitude, com arbustos altos, mas ainda muito verde. O tempo deu uma nublada
e a noite ficou mais fria e com um céu lindo! Neste dia subimos ~1.200m.
Muitas flores nos vários estágios da escalada.
Depois de passar pela floresta, chegamos no lugar do primeiro acampamento.
No segundo dia, a paisagem vai mudando ainda mais e começamos a comer
poeira, literalmente! Vamos subindo, as nuvens vão ficando abaixo de nós, os
gaviões brincando no céu acima, tudo cercado de flores...maravilhoso! Vamos
subindo, passando as nuvens com o Monte Neru (2ª maior montanha, 4.556m) ao
lado.
Eu e o Monte Neru ao fundo, já acima das nuvens :)
Essa foto me encanta! A mistura do branco das flores que forram as pedras, as nuvens e o Neru.
Meu cabelo estava perfeito para montar um rastafári, mais duro
impossível!! Chegamos no camping e depois de um banho de ‘toalinha’ fomos
conversar abobrinha J. A comida, perfeita! A turma, perfeita! Só alegria no
Shira Cave (camping), apesar da paisagem meio devastadora, com grandes pedras
vulcânicas por toda parte. São impressionantes as mudanças na paisagem. Por cada
tipo de paisagem que passamos encontramos espécies endêmicas
Parada para o almoço...olha que o povo carrega mesinha e banquinhos!
Nosso segundo acampamento.
Tudo que você tem para 'tomar banho' é essa bacia...tem de aproveitar para tudo!
Terceiro acampamento, já na sombra do Kili!
O dia 16, terceiro de escalada, foi bem cansativo. Subimos para 4.700m
(Lava Tower), depois descemos para 3.950m (Barranco Hut), mas a paisagem
compensou tudo. Muitas mudanças na paisagem, mas no local que acampamos ficamos
cercados pelas lobélias, um tipo de cactácea que pode viver até 70 anos, e
flores. Passamos por pequenas cachoeiras de degelo, e chegamos a tempo de pegar
o pôr-do-sol, já com seus reflexos vermelhos no Kili!
As lobélias no meio de um riachinho com gelo.
Esse morro aí na frente é a Lava Tower, que subimos.
Cume do Kili.
O quarto dia é bem puxado, pois tem várias subidonas e descidonas...e,
quando chegamos no acampamento, adivinha? Next Day – summit!! Ou seja, mal
chegamos para descansar e vamos levantar às 23h para o ataque ao cume à meia
noite! Isso porque a ideia é chegar ao cume para ver o sol nascer lá!! Parece
piada, né? Você tá cansado, com frio, não consegue dormir e tem de atacar o
cume! Partimos por volta de 00:20hr do Barafu Camp, a 4.600m rumo ao topo da
África.
Pôr-do-sol no terceiro camping, a montanha parece pegar fogo!
Lobélias gigantes...
Muita gente subestima a escalada do Kili porque não é uma escalada
técnica, mas, estamos em alta montanha, e se você não estiver aclimatado pode
ter graves problemas. Na verdade, a escalada do Kili é muito rápida se
comparada com outras para se atingir a mesma altitude. O resultado disso é o
que ajuda a montanha a ficar difícil. Ascender rapidamente é um alto risco. É preciso
ficar atento aos sintomas provocados pelo ar rarefeito, e, se necessário, dar o
tempo necessário para o corpo se adaptar.
Dia de subidona e descidona...
No começo a trilha do cume parece uma fila de vagalumes J, por causa da lanternas de cabeça utilizadas. Acho que nunca tinha
vestido tanta roupa na minha vida, 4 camadas! Lá vamos nós...me sentia super
bem.
Ganhando altitude comecei a me sentir muito fraca, meu ritmo caiu muito
e o grupo precisou ter paciência comigo. Ventava forte, devia fazer -15º C, e
eu não entendia direito o que estava acontecendo comigo. Os ventos sempre
pioram ao amanhecer, quando temos uma inversão térmica, e eu tinha vontade de
achar um canto e ficar lá quietinha. Enfim, muito devagar, chegamos ao Stella
Point (a borda da cratera do Kili) quando as cores no céu começaram a mudar.
Pedi para parar e ficamos ali, deslumbrados vendo a cor laranja tomar conta das
nuvens abaixo e o astro rei brilhar no topo da África!! Chorei (pra variar!).
MUUUITO lindo! J
Bom, faltava pouco para chegar ao cume, devagarinho, de passinho a
passinho cheguei! Uhuru Peak – 5.895m.
O dia de cume é realmente duro, principalmente pelo tipo de solo da
montanha, é dar dois passos subindo e escorregar um de volta...muito íngreme,
só cascalho solto e areia (lava esfarelada!), no escuro, sem saber o que está
em volta, frio, me sentindo mal, isso tudo é escalar uma montanha. Foi a minha
primeira dos famosos 7 cumes!
Stella Point.
No cume, comemoramos muito, abrimos uma pequena garrafa de champanhe e
apreciamos a paisagem deslumbrante em volta! Depois que o sol nasce tudo se
transforma, você ganha vida com o calor e com a beleza que o cerca! Estávamos ‘nas’
neves eternas do Kilimanjaro!
Festa! muita alegria, cume do Kili!
Uhuru Peak, 5.895m, ponto mais alto da África.
Na descida, com o terreno superinclinado, você consegue ‘correr’ socando
o calcanhar no chão e se jogando pra trás. Ainda me sentia fraca, meio tonta, mas
pra descer todo santo ajuda!!
Quando cheguei na barraca me larguei no chão e fiquei lá 15-20min
quieta, tentando absorver a experiência. Foi aí que descobri que eu tinha
ficado menstruada L!!! Minha pressão deve ter baixado e a escalada pra
mim foi realmente punk! Bom, só experimentando pra aprender e entender como seu
corpo responde, como se adapta, como muda em altitude. São muitas mudanças, e nessa
escalada, tudo muito rápido! Graças a Deus deu tudo certo! J
Pedi uma licencinha para apresentar a barraca da cozinha...
Neste caso, tive sorte de ter bastante apoio do grupo, a minha vitória foi
uma vitória de todos!
O esquema do ‘batidão’ ainda não tinha terminado! Acho que chegamos no
cume por volta de 6:30hr, estávamos no camping de volta lá pelas 10:30hr, e a
ideia era descansar até meio dia, e seguir a descida da montanha por outra rota
– a Mueka. É um dia inteiro super intenso, mas quando se conquista o objetivos
tudo fica mais fácil, mais leve.
Escalada contada, vamos a outros detalhes interessantes dela. Fomos em
3, com uma guia brasileira, que contratou os serviços de guia e carregadores locais.
Isso tudo é uma festa!! Imagina uma fila de carregadores atrás de você. Lá cada
um só pode carregar 10kg! Fomos levando muitas verduras, ovos, frutas, todos os
apetrechos para a comida, estrutura para mesinha e banquinhos, barracas, inacreditável.
Nas minhas anotações eu coloquei 18 pessoas...mas, até eu duvido! Na África as
expedições normais são assim, vai uma multidão junto, tem trabalho pra todo
mundo $$!
De certa forma, isso trouxe conforto, a comida foi ótima, o intestino
funcionou bem, o guia era super solícito, e foi tudo ótimo! Depois de alguns
anos, recebi um email desse guia – Frederick – e ele havia montado sua própria
agência. Muito legal, considerando as dificuldades que eles têm por lá!
No dia que chegamos de volta à Arusha, 19/ago, fomos dar uma volta na
feira de artesanato da cidade, acompanhados pelo guia, e o convidamos para
jantar conosco para celebrar. Foi ótimo, pedimos para ir a um restaurante local
(não para turistas, pois a realidade é completamente diferente!). Fomos nós, o
Frederick, sua esposa e seu cunhado. Nós, com nossas roupas de turistas
aventureiros, e eles com suas roupas super coloridas. O máximo!! Adoramos tudo!
Apesar de eu contar as histórias encantada, fui alertada algumas vezes
para tomar bastante cuidado nas cidades. Ouvimos algumas histórias de
violência, furtos, coisas que assustam, mas que acontecem em qualquer lugar,
independente de ter uma cultura muito diferente, ou de ser muito pobre. Todo
mundo conhece a realidade da maioria dos países da África...
Agora, vou contar um pouco da outra parte da viagem, sobre os safáris...
Esse é o tipo de viagem que não faz o menor sentido contar apenas a
parte da montanha, pois, o ‘estar na natureza’ é o que mais vale!
As estradas de acesso aos parques já são uma aventura! Só buraco, poeira, e paradas para esperar os bichos passarem :)
Dá uma olhada lá na frente...
Dia 20, pé na estrada, de Arusha seguimos para o Lake Manyara National
Park. Caramba!! Mudança radical na programação...de uma barraca lascada para um
hotel 5 estrelas J!!
Esse é o Lodge Seronera, no Serengeti. De dentro da área do hotel a gente só pode sair de jeep.
Além da beleza do parque, tenho de falar dos hotéis/lodges porque são
fantásticos. No Manyara meu quarto tinha a parede, que dava para o parque, de
vidro. Eu abria a cortina e estava de frente para o lago com a bicharada toda
rondando...acordei com rugido de leões, aves, macacos trepando pra todo lado. Vi
o sol nascer nesse cenário...nunca mais vou esquecer! Os lodges são inseridos
dentro dos parques, no meio da bichadara! É o máximo!!!
Lilac Breasted Roller
Superb Starling.
Bom, no Manyara o lago é a maior atração. Os hipopótamos parecem
pedras...você fica horas esperando eles se manifestarem! E se der muita sorte
vai conseguir uma daqueles fotos com eles abrindo a boca J. A minha não ficou muito boa não, mas consegui. Floresta de acácias
cheias de macacos – blue monkey e baboons. Nas árvores também se vê os leões
dormindo e suas caças penduradas! A quantidade e a variedade de pássaros são
enormes. Isso é um paraíso para observação da natureza.
Os hipos parecem uma pedras na água, ficam um tempão sem se mexer :)
Não descobri o nome dessa lindeza :/
O esquema é, você vai de jeep aberto vendo a bicharada em volta, e em
alguns locais é permitido descer, como perto do lago, mas tudo bem controlado.
Afinal, estamos no meio da vida selvagem!
Amanhecer na savana.
Leoa caçando uma gazela. Acompanhamos toda a caça :)
Gazela morta pendurada na árvore....esse aí deixou o almoço garantido!
De lá fomos para o Serengeti. Essa é uma palavra maasai que significa
planície sem fim (siringet), mas na verdade é um planalto sem fim, pois estamos
a 1.600m!! A vastidão encanta! Você anda, e anda, e anda e é tudo planície em
volta, e bicho pra todo lado! Ficamos no Seronera Valey, no meio do parque, e o
lodge ficava todo encravado no meio da paisagem, com várias kopjes (‘copis’, pedras
gigantes) no meio. Simplesmente LINDO! E mesmo esquema, você abre a cortina e a
bicharada tá toda em volta J. Nesse lugar acho que tivemos as melhores refeições
da viagem...
O rei...
A beleza da savana!
Uma festa de zebras e gnus...todos vivem em paz = tem comida pra todo mundo!
Essa a gente já viu comendo, não se se caçou ou se pegou de alguém...
Topi, posando pra foto.
Leoa descansando...
Os passeios pela savana são memórias maravilhosas. Ainda hoje é possível
fechar os olhos e me transportar para lá. Vimos leopardos dormindo em cima das
árvores, cheetahs com seus filhotes, aves de todos os tipos, elefantes,
hipopótamos, lagartos coloridos, hyracs, hienas caçando, leoas caçando, leões,
chacal, javali, impalas, gazelas, topi, headbuck, serval, girafas, búfalo, bambies, gnus, zebras, crocodilos, marabus, tuiuiu e o pôr-do-sol mais lindo da minha vida J...não tenho palavras para
descrever tanta beleza!
Pôr-do-sol no Serengeti
Nascer do sol no Serengeti :)
Para pegar a bicharada acordada e caçando mudamos nosso horário e
passamos a funcionar como eles J. A gente acordava antes do sol nascer e saía...pegava
a bicharada toda acordando, se movimentando e caçando. Lá pelas 9h voltávamos
para o lodge, tomávamos o café da manhã, e ficávamos lagarteando (isso mesmo! Sabe,
ficar lá paradinho no sol, sem nem mexer), só comendo e descansando no horário
mais quente, até a hora do pôr-do-sol (16-17h), quando saíamos de novo para
pegar o movimento, e voltávamos para o jantar. Vida de rei! Aprendemos com a
bicharada :D
Grey Headed Kingfisher
ADORO!
Dentro da cratera do Ngorongoro, riqueza enorme da fauna. Flamingos...
Família reunida.
Do Serengeti fomos para o Ngorongoro, uma grande cratera, que tem dentro
dela um habitat/ecossistema que mantém a bicharada toda por lá, é gigante! Dessa
vez, o lodge ficava no alto, na borda da cratera e era possível avistar ao
longe toda a extensão do antigo vulcão. Bom, mesma bicharada circulando...essa região
é famosa no período da migração dos animais que passam por aí e pelo Serengeti.
Dá pra ver o alto da borda da cratera...as migrações passam por aí.
Gansos?
No caminho passamos por um sítio arqueológico, Oldupai, ou a Garganta de
Olduvai, que é considerado um dos berços da humanidade. Aí foi encontrada uma
ossada de 3,6 bilhões de anos do primeiro hominídeo do planeta. Essa é uma
região maasai. Passamos por algumas aldeias na estrada e paramos numa delas
para conhecer. Quando entramos eles começaram a cantar e saltar para nos
receber. Todos muito coloridos e superproduzidos com seus artesanatos de miçangas.
É uma vida simples, dura, com certeza, mas não há miséria e parecem felizes.
São fortes, bonitos, pastores, seminômades e preservam sua cultura e modo de
vida.
Mais girafas, pra mim elas são eleitas o símbolo da África :)
Nas kopjes tem vários tipos de lagarto colorido
Os maasais, pastores 'nômades'.
Nas aldeias uns cuidam dos outros, é muito legal!
Tô aí com o chefe da aldeia :)
Não tá fácil pra ninguém...aos 15 anos eles precisam passar por um ritual para retornar à tribo
Seguimos então para o nosso último parque, o Taranguire. De lá as melhores
memórias são do jantar de primeira classe, vip, vinho maravilhoso, jazz, e a
celebração de fechamento de uma viagem linda! Acho que já vimos tantos bichos
nos outros parques que os elefantes, zebras e macacos de lá já ficaram mais ‘normais’
J! MAS, aí tem baobás!!! Ainda não tínhamos visto
baobás!! Outro ícone da África. O máximo!
Muitos elefantes...
O MÁXIMO, os baobás!
Blue monkey...estão por toda parte!
Adivinha o nome da árvore? salchicha! rs...
Com tanta coisa boa, só mesmo agradecendo muito pelas oportunidades! Voltamos
para Arusha, Nairobi, Johannesburg, onde fizemos o jantar de despedida, super
maravilhoso! Não poderia deixar de ser, como os demais que tivemos, só alegria!
De volta para o Brasil ficam as recordações dessa aventura maravilhosa, e o
recado de aproveitar cada minuto dessa vida! Hakuna matata! Vamos curtir :)
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