A conquista do topo do Brasil - 2.994m (Recapitulando, out/2007)
Completamente
diferente da alta montanha das cordilheiras do planeta, a maior ‘montanha’
brasileira fica no meio da floresta Amazônica, com 2.994m de altitude e muitas
aventuras até o topo!!
Voei de Brasília
para Manaus, e depois para São Gabriel da Cachoeira, última cidade no noroeste
do Amazonas, divisa do Brasil com a Colômbia e com a Venezuela. Para se chegar
ao início da trilha ainda se percorre 85km de estrada de lama esburacada e
quase dois dias navegando pelos rios da floresta.
São Gabriel da Cachoeira.
Por lá a população é praticamente indígena. E, além dos índios, tem o pessoal do Batalhão de Selva do Exército.
Para enfrentar a
estrada contamos com a ajuda do Exército, depois seguimos de voadeira. Nossa
segurança na floresta estava mais ou menos garantida pela autorização das
tribos locais, obtida com a ajuda dos organizadores da expedição. Além dessa
autorização também tínhamos autorizações do Ibama e da Funai.
Eu, meus colegas de Neblina, o guia Marcelo e o pessoal do Exército, que nos levaria até o rio.
Aí dá pra ter uma ideia do que é a estrada...
Era essencial ter
nossas autorizações em mãos o tempo todo. São famosos os incidentes com pessoas
capturadas pelos indígenas como ‘invasores’. E o processo de liberação é sempre
complicado, como a comunicação com culturas que ainda vivem bem isoladas da
nossa vida urbana. Para facilitar nossa aventura, contamos com a ajuda de três
índios na equipe, que trabalharam de guia, carregadores e cozinheiros. Dois
deles subiram na canoa na Reserva chamada Balaio, e mais um, no dia seguinte, na aldeia yanomami Nazaré, onde dormimos.
Cruzando a linha do Equador!
As barracas e nossas coisas na maloca...
Crianças na Reserva do Balaio.
A navegação pelos
rios da Amazônia exige bastante prática. São árvores, troncos, pedras no meio
da correnteza. Às vezes, o rio corre largo, outras mais raso e estreito. Exige
atenção o tempo todo. De vez em quando um susto, mas em regra, dava pra relaxar
e curtir o visual da floresta, procurando pássaros e outros bichos nas margens.
Navegando pelo rio Cauaburi.
Em Nazaré, éramos a
atração das crianças: brancos, roupas estranhas, língua estranha,
barraca...imagina¿! colocamos as barracas debaixo de uma palhoça. No dia seguinte,
demos uma volta para entender a organização da aldeia e conhecer um pouco da
rotina, e seguimos viagem.
No barco, as
montanhas rochosas começam a aparecer, contrastando com a paisagem da floresta.
Um cenário lindo! Quando chegamos no
lugar que iniciaríamos a trilha na floresta, subimos a voadeira no barranco,
escondemos o motor, arrumamos todo o material, equipamentos, mantimentos, e já era hora de montar as
barracas, fazer a fogueira e preparar a janta. Na verdade, quem fazia quase
tudo eram os índios e o guia Marcelo que seguia conosco. Éramos cinco colegas
montanhistas, um deles o André Dib, que é fotógrafo profissional, e estava
responsável por registrar a expedição. Nós éramos 9 no total.
Em alguns trechos do sinuoso rio as montanhas apareciam, encantando!
Eu nunca dormi bem
em rede, mas o calor na barraca era complicado!! Não dava pra deixar nada
aberto por causa dos insetos. A maioria terminou optando pela rede. A trilha, mesmo
nos lugares mais abertos, sempre tinha raízes e troncos por toda parte, exigindo atenção, e com o tempo, prática para não torcer o tornozelo, bater a cabeça e
por aí vai...mosquitos e insetos eram companheiros constantes naquela umidade
total.
No meio da floresta...(André Dib)
Félix cozinhando. (André Dib)
Muito calor, mosquitos,
insetos, chuva, lama, rios...é esse o dia-a-dia até chegar ao sopé da montanha
e realmente começar a escalada. Subimos ao todo praticamente a altura da montanha, pois saímos do nível do rio. A gente passava o dia todo molhado, de suor
ou de chuva! Isso gera um desgaste ainda maior com o exercício físico, cada um
carregando sua mochila e lutando para manter alguma coisa seca lá dentro. Ao
final da expedição perdi minha máquina fotográfica, que não suportou a
umidade...e, olha que ela já tinha resistido a muuuita coisa! O pior, foi
perder alguns filmes L!
Foram seis dias de
trilha na floresta, quatro para subir ao cume e dois para descer. Em alguns momentos de chuva muito forte os lugares mais fáceis
para passar viravam verdadeiros riachos, aumentando as dificuldades para
seguir, e a organização dos acampamentos. Não vimos nenhum bicho, apenas
pegadas, alguns ruídos, mas eles não se apresentaram!
Paisagem mudando com a altitude, mais aberta, muitas bromélias e outras plantas cortantes...
Enfim, uma aparição do Neblina!
Comendo, num dos acampamentos. (André Dib)
O trecho do último
acampamento para a base da pedra foi o mais complicado. Os guias avisaram que
passaríamos por um atoleiro, e só...então, no começo, todos tentando poupar as
botas e não cair, e não sujar...e, foi um show de horror, até a gente desistir e
literalmente ‘enfiar o pé na jaca’ com gosto!!! Não dava pra tentar usar nada
pra pisar ou apoiar porque escorregava e podia ser ainda pior. E, isso demorou,
que, toda hora, tinha um perguntando quanto tempo ainda faltava, e xingava, foi
uma novela! A parte mais fácil da aventura foi subir a montanha!
Último acampamento antes do dia do cume. Em regra, as clareiras eram áreas ocupadas pelos garimpos.
Ganhando altura.
O clarão é o local do último camping.
Subida final, antes da chuva.
Trechos de escalaminhada com exposição.
Os índios disseram
que não poderiam subir, tinham muito medo, e diziam que não tinham roupas para
aguentar o frio lá em cima. Nós conseguimos convencê-los. Garantimos que
poderiam usar nossas roupas e que seria tranquilo. Eles foram! Talvez os
primeiros de suas aldeias a subirem na montanha mais alta do país, ou os primeiros índios do Brasil.
Por sorte o dia
estava aberto, e a chuva só chegou junto com a gente, a uns poucos metros do
cume, pra complicar a arrumação do acampamento. Ao final, apesar de felizes com a conquista, a gente só pensava em se aquecer dentro da barraca, enxarcados! Porém, conseguimos
escalar tranquilos. Alguns trechos mais íngremes, outras escalaminhadas mais expostas que possuíam
cordas antigas, que mesmo sabendo que não poderíamos confiar, utilizamos. Não
tínhamos corda, o que seria uma boa para dar suporte em algumas passagens expostas,
principalmente por causa da umidade. A montanha tem muita vegetação na pedra,
bromélias, e isso complica a aderência.
Eu, no cume! (André Dib)
O nome Neblina faz
juz a toda região, e não somente à montanha. Quando conseguíamos um lugar mais
aberto na floresta o que víamos era sempre um branco L!!! A visibilidade é péssima! Mas, por sorte, depois da chuva que nos
recebeu no cume, fomos abençoados com um tímido pôr-do-sol, quando tivemos a
oportunidade de ver o horizonte aberto por algum tempo. Fantástico! Realmente,
um presente dos Deuses poder ver e sentir toda a dimensão da floresta e do lugar onde estávamos!
Visual do cume.
Na volta, me lembro
de estar sozinha na trilha quando começou uma tempestade daquelas de filme de
terror, com raio caindo, visibilidade ruim, um perrengue memorável! No final, tudo certo :D! Só aventura! Encontramos
também com alguns garimpeiros durante a trilha. Achei muito interessante poder
conhecer um pouco da vida sofrida desses mateiros ‘ilegais’ na floresta. Não
foi perigoso, pelo contrário, tivemos sempre uma boa acolhida, e pudemos ouvir um pouco de suas histórias na selva.
Enfim, de volta ao
rio, e depois à cidade, todos os perrengues da aventura se tornam fáceis de
contar aos amigos. Nada de: tudo molhado, mosquitos, cansaço, fome, etc...aliás,
qualquer coisa, por mais simples que seja tem muito mais valor. Um ‘prato feito’
e um quarto, dos mais simples possível, se tornam maravilhosos! O esforço valeu
muito a pena - conquistamos o topo do Brasil! J
Esta expedição foi
documentada pelo colega André Dib, e apresentada na revista Os Caminhos da
Terra na edição de janeiro/08. Agradeço a ele por ceder algumas imagens
maravilhosas para ilustrar meu relato.
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